
TRANSPORTE DE MEMBRANA: TRANPORTE ATIVO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO
Este post é a transcrição da videoaula publicada em nosso canal do YouTube "[#4] TRANSPORTE DE MEMBRANA: TRANPORTE ATIVO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO".
TRANSCRIÇÕESFISIOLOGIA CELULAR
Mirian Kurauti
8/7/202412 min read
E aí pessoal, tudo bem com vocês?
No vídeo anterior, a gente falou sobre o transporte passivo, nesse vídeo a gente vai falar sobre o transporte ativo que acontece através da membrana plasmática das células.
Pra você que tá chegando agora e ainda não me conhece, eu sou Mirian Kurauti, professora, mestre, doutora e criadora do canal MK Fisiologia, um canal que tem como principal objetivo descomplicar a fisiologia. Porque como eu sempre digo fisiologia não precisa ser difícil. Então se você tá precisando entender de verdade a fisiologia, já se inscreve no canal e ative as notificações pra você não perder os próximos vídeos que a gente postar por aqui.
Agora bora falar sobre o transporte ativo que acontece através da membrana plasmática das células?
Como vimos no vídeo anterior, o transporte passivo é um transporte que acontece a favor do gradiente de concentração ou gradiente químico, quando soluto é neutro, ou a favor do gradiente eletroquímico, quando o soluto não é neutro e tem cargas elétricas positivas ou negativas sobrando, como é o caso dos íons.
Então se o transporte passivo é sempre a favor do gradiente químico ou eletroquímico, adivinha como vai ser o transporte ativo? Sempre contra o gradiente químico ou eletroquímico.
Pra facilitar, lembre-se que quando a gente fala do gradiente eletroquímicos dos íons, a gente fala de uma soma dos gradientes elétrico e químico dessas partículas. Mas como o gradiente químico na maioria dos casos, se não todos, é maior que o gradiente elétrico, ou seja, supera o gradiente elétrico, pra saber se o transporte é passivo ou ativo, olhe pro gradiente químico, isto é, pro gradiente de concentração dos íons. Se tiver contra esse gradiente, o transporte é ativo.
Tô dando essa dica porque eu sei que o gradiente eletroquímico ainda pode ser difícil de entender nesse momento. Então, lembre-se que o gradiente químico, na maioria dos casos, vai ser mais importante do que o gradiente elétrico na determinação da direção do movimento dos íons. Beleza?
Dito isso, a gente pode simplificar a definição do transporte ativo e dizer que o transporte ativo acontece contra o gradiente químico, contra o gradiente de concentração, ou seja, os solutos são transportados do compartimento onde ele tá menos concentrado pro compartimento onde ele tá mais concentrado, sempre através de uma proteína carreadora.
E lembre-se, como nesse tipo de transporte os solutos precisam ser “empurrados” contra o seu gradiente de concentração, é preciso gastar energia pra fazer isso, por isso transporte ativo.
Fazendo uma analogia, é como “empurrar” as pessoas pra dentro de um ônibus ou metrô lotado, super concentrado de gente, você precisa gastar energia pra empurrar as pessoas contra um gradiente de concentração.
Mas a questão é:
"De onde vem a energia pra “empurrar” os solutos contra o gradiente de concentração?"
Pra responder essa pergunta, lembre-se que dependendo de onde vem essa energia pra “empurrar” um determinado soluto contra o seu gradiente de concentração, a gente vai ter dois tipos de transporte ativo: o transporte ativo primário e o transporte ativo secundário.
"Como assim?"
Presta atenção, quando a energia vem da hidrólise ou da quebra de uma molécula de ATP, o transporte ativo é classificado como transporte ativo primário. Nesse tipo de transporte, a proteína carreadora tem atividade ATPase, isto é, ela tem um sítio onde o ATP pode se ligar, e quando o ATP se liga nesse sítio ela atua como uma enzima, por isso seu nome termina em “ase”, ATPase, hidrolisa, quebra o ATP. Essa quebra libera energia, que pode ser utilizada pela própria proteína carreadora pra transportar um ou mais solutos, contra o gradiente de concentração.
Pelo fato desse tipo de proteína carreadora ter atividade ATPase, essa proteína pode ser chamada simplesmente de ATPase, ou pode ser chamada de bomba, mas não porque ela explode a membrana, mas sim porque ela bombeia os solutos contra uma força, nesse caso, contra uma força química, contra a força do gradiente de concentração do soluto.
É o mesmo princípio de uma bomba de água, por exemplo. Pra usar a água de um rio que passa no ponto mais baixo de uma chácara ou de um sítio, você precisa usar uma bomba de água que usa energia, pra “empurrar” a água até a caixa d’água que fica em um ponto mais alto do sítio, ou seja, essa bomba “empurra” a água contra uma força, contra a força da gravidade.
O principal exemplo de uma proteína carreadora ATPase ou bomba, é a Na+/K+ ATPase ou bomba de Na+/K+. Essa bomba é encontrada na membrana plasmática de praticamente todas as células do organismo humano, e é responsável pelas altas concentrações de sódio fora da célula no líquido extracelular e altas concentrações de potássio dentro da célula no líquido intracelular ou citosol. Isso porque pra cada molécula de ATP ela utiliza, ela transporta três íons sódio pra fora e dois íons potássio pra dentro da célula.
Pra entender como essa bomba funciona, a gente pode mostrar um passo-a-passo do seu funcionamento.
Então num primeiro momento, a bomba já tá com o ATP ligado no seu sítio ativo (lembre-se que a bomba é uma enzima e como toda enzima ela tem um sítio ativo, ou seja, um lugar onde vai ocorrer uma reação química, nesse caso, onde vai ocorrer a hidrólise ou quebra do ATP). Nessa conformação, os três sítios de ligação pro íon sódio estão voltados pro interior da célula e tem alta afinidade por esse íon.
Quando três íons sódio se ligam nesses sítios de ligação, a bomba hidrolisa, quebra o ATP em ADP + fosfato, o ADP vai embora, mas o fosfato fica ligado em resíduo de aminoácido da bomba, ou seja, a bomba fica fosforilada. Essa fosforilação, faz a proteína mudar de conformação. Nessa mudança de conformação, os íons sódio ficam presos sem saída no meio da bomba, e logo em seguida a bomba abre pro outro lado da membrana e esses íons podem ter acesso ao exterior da célula.
Como nessa conformação a afinidade pelos íons sódio diminui, esses íons se desligam da bomba e são liberados no líquido extracelular. Quando isso acontece, a afinidade pelos íons potássio aumenta e dois íons potássio se ligam nos seus dois sítios de ligação.
A bomba então se desfosforila, ou seja, o fosfato é liberado e isso causa uma mudança na conformação da proteína. Nessa mudança de conformação, os íons potássio ficam presos sem saída no meio da bomba, e logo em seguida a bomba abre pro outro lado da membrana e esses íons podem ter acesso ao interior da célula.
Nesse momento outra molécula de ATP se liga no sítio ativo da bomba, e isso diminui a afinidade pelos íons potássio, os quais se desligam dos seus sítios de ligação, sendo liberados no líquido intracelular ou melhor, no citosol da célula. A bomba agora tá pronta pra iniciar um novo ciclo de transporte dos íons sódio e potássio contra o gradiente de concentração desses íons.
Um detalhe que alguns livros podem trazer sobre essa bomba, é que ela é considerada uma ATPase ou uma bomba tipo P. Isso porque ela usa um ATP pra pegar um fosfato dele e adicionar na sua estrutura, ou seja, ela usa um ATP pra se fosforilar. Como em inglês fosforilação é com “ph”, “phosphorylation” todas as bombas que se fosforilam são classificadas como bombas tipo P.
E só pra constar, existem outras bombas tipo P que transportam outros íons contra o seu gradiente de concentração, não apenas na membrana plasmática, mas também em outras membranas como a membrana do retículo endoplasmático, por exemplo.
Ah e não é apenas esse tipo de bomba que realiza transporte ativo primário, tem outras bombas que podem fazer esse tipo de transporte, como os transportadores ABC que podem estar presente na membrana plasmática das células e as bombas tipo V tão presentes na membrana dos lisossomos das células.
Mas nesse momento, o mais importante é entender que o transporte ativo primário é um transporte contra o gradiente de concentração dos solutos realizado por proteínas carreadoras ATPases ou bombas, o que é diferente do transporte ativo secundário que, presta atenção, é um transporte contra o gradiente de concentração dos solutos só que realizado por proteínas carreadoras que não tem atividade ATPase, ou seja, que não são capazes de hidrolisar ou quebrar o ATP.
"Mas professora, no transporte ativo secundário também não precisa de energia pra “empurrar” os solutos contra o gradiente de concentração? Se a proteína carreadora não quebra ATP, de onde vem a energia pra realizar esse tipo de transporte?"
Nesse tipo de transporte, a energia vem do gradiente de concentração de um outro soluto, geralmente do gradiente de concentração do íon sódio.
"Como assim?"
Presta atenção, no transporte ativo secundário, a proteína carreadora transporta ativamente pelo menos um soluto contra o seu gradiente de concentração e transporta passivamente pelo menos um soluto a favor do seu gradiente de concentração. Por isso dizemos que no transporte ativo secundário, o transporte ativo de solutos contra o seu gradiente é acoplado ao transporte passivo de um outro soluto a favor do seu gradiente de concentração.
Um exemplo de transporte ativo secundário é o transporte ativo da glicose acoplado ao transporte passivo de sódio realizado pelo transportador de sódio-glicose conhecido como SGLT (do inglês "sodium-glucose cotransporter").
Existe dois tipos desse transportador, o SGLT-1 e o SGLT-2. Aqui a gente vai mostrar o SGLT-1, que tá presente nas células epiteliais que revestem a parede do intestino delgado e é super importante pra absorção intestinal da glicose. Nessas células, o SGTL-1 fica na membrana voltada pro interior do intestino, ou melhor, para o lúmen do intestino, onde passa tudo o que a gente ingere. O sódio entra a favor do seu gradiente de concentração criado pela bomba de Na+/K+ e esse transporte ainda fornece energia pra transportar a glicose contra o seu gradiente de concentração, para dentro da célula.
Do outro lado da célula, na membrana voltada pro interior do organismo banhada pelo líquido intracelular o sódio é transportado pra fora da célula ativamente contra seu gradiente de concentração pela bomba de Na+/K+, e a glicose é transportada pra fora da célula passivamente a favor do seu gradiente de concentração agora pelo transportador de glicose GLUT que a gente mostrou no vídeo anterior.
Mas falando sobre o SGLT-1 que realiza transporte ativo secundário da glicose, não se esqueça, ele tem dois sítios de ligação para o íon sódio e um sítio de ligação pra glicose. Quando esses sítios ficam expostos no lúmen do intestino, como o íon sódio é mais concentrado desse lado da membrana, dois íons sódio se ligam aos seus sítios de ligação, e isso aumenta a afinidade pela glicose que agora consegue se ligar ao seu sítio de ligação. A proteína então muda de conformação e os íons sódio e a glicose são expostos no citosol da célula, e como nesse meio tem baixas concentração do íon sódio, esses íons se desligam dos seus sítios de ligação e isso diminui a finidade da proteína pela glicose que também se desliga do seu sítio de ligação.
Repare que o transporte da glicose é contra o seu gradiente de concentração, e a energia pra fazer esse transporte ativo vem do gradiente de concentração do sódio, que tem um gradiente de concentração com energia suficiente pra fazer o transporte do sódio a favor do seu gradiente, e ainda “empurrar” a glicose contra o seu gradiente de concentração.
Fazendo uma analogia, o movimento do sódio a favor do seu gradiente de concentração é como se fosse o movimento da água descendo um rio, esse movimento a favor da gravidade, tem tanta energia que pode mover outras coisas, como um moinho de água, por exemplo. No caso do movimento do sódio, esse movimento tem tanta energia que pode mover a glicose contra o seu gradiente de concentração.
Agora uma observação importante é que nesse exemplo de transporte ativo secundário, o transporte da glicose acontece na mesma direção do transporte do sódio, e por isso a gente pode chamar esse transporte de simporte ou cotransporte, e a proteína carreadora de simportador ou cotransportador.
E não se esqueça que o transportador de sódio-glicose SGTL é só um exemplo dentre muitos outros cotransportadores que realizam transporte ativo secundário, ou seja, que acoplam o transporte de um ou mais solutos contra o seu gradiente de concentração ao transporte de sódio ou outros solutos a favor do seu gradiente de concentração.
Nesse momento, você não precisa conhecer todos os cotransportadores presentes na membrana plasmática de todas as células, porque você vai conhecer eles aos poucos conforme for avançando no estudo da fisiologia.
Mas uma coisa importante que você precisa saber é que o transporte ativo secundário também pode ser realizado por antiportadores ou contratransportadores, isto é, proteínas carreadoras que realizam um antiporte ou contratransporte, ou seja, que transportam solutos em direções opostas, um ou mais solutos em uma direção e um ou mais solutos na outra direção. É como se essas proteínas carreadoras trocassem um ou mais solutos por outro ou outros solutos. Por isso os antiportadores ou contratranspotadores também podem ser chamados de trocadores, como por exemplo o trocador sódio-cálcio NCX, que acopla o transporte de um íon cálcio contra o seu gradiente de concentração ao transporte de três íons sódio a favor do seu gradiente de concentração.
E só pra você saber, assim como existem vários cotransportadores, também existem vários trocadores presentes na membrana plasmática das células, e conforme você for estudando a fisiologia, você vai conhecer esses trocadores.
Então, nesse momento não se preocupe em decorar todos os cotransportadores e trocadores que apareceram como exemplo por aqui, o mais importante é entender que nesses tipos de proteínas carreadoras que não tem atividade ATPase, a energia pra transportar um soluto contra o seu gradiente de concentração, vem do gradiente de concentração de outro soluto, e como vimos, esse outro soluto geralmente é o íon sódio, mostrando a importância do transporte ativo primário realizado pela bomba de Na+/K+ que mantém o gradiente de concentração do íon sódio.
Então, já finalizando o vídeo, não se esqueça que esses são os principais tipos de transporte ativo, o transporte ativo primário e o transporte ativo secundário. Porém, alguns livros podem trazer mais outros dois tipos de transporte ativo, a endocitose e a exocitose, mas esses tipos de transporte ativo, não são um transporte através da membrana plasmática, na verdade são bem mais complexos do que os transportes passivos e ativos que acontecem através da membrana plasmática, e eles serão discutidos quando falarmos sobre o sistema de endomembranas, formado pelo retículo endoplasmático, complexo de golgi, endossomos e lisossomos.
Bom então resumindo tudo que a gente viu nesse vídeo lembre-se que:
Enquanto no transporte passivo o soluto é transportado a favor do seu gradiente de concentração, no transporte ativo o soluto é transportado contra o seu gradiente de concentração, ou seja, do lado menos concentrado pro lado mais concentração.
Quando a proteína carreadora é uma ATPase ou uma bomba, a energia pra empurrar o soluto contra o seu gradiente de concentração, vem da hidrólise ou da quebra do ATP, e o transporte realizado por esse tipo de proteína é sempre um transporte ativo primário.
Mas quando a proteína carreadora não tem atividade ATPase, a energia pra empurrar o soluto contra o seu gradiente de concentração, vem do gradiente de concentração de outro soluto, geralmente do íon sódio, ou seja, o transporte de um soluto contra o seu gradiente é acoplado ao transporte de outro soluto a favor do seu gradiente de concentração, e por isso o transporte ativo realizado por essa proteína é secundário.
Por fim, lembre-se que existem basicamente dois tipos de proteínas carreadoras sem atividade ATPase que realizam transporte ativo secundário, os cotransportadores que transportam os solutos na mesma direção, e os trocadores que transportam os solutos em direção opostas.
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Bom, a gente vai ficando por aqui. Qualquer dúvida pode deixar aí nos comentários que a gente tenta responder, beleza? A gente se vê num próximo vídeo. Abraço!


Sobre a autora
Mirian Ayumi Kurauti é apaixonada pela fisiologia, com uma trajetória acadêmica admirável. Ela se formou em Biomedicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), fez mestrado e doutorado em Biologia Funcional e Molecular com ênfase em Fisiologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e ainda atuou como pesquisadora de pós-doutorado na mesma instituição. Além disso, já lecionou fisiologia humana na Universidade Estadual de Maringá (UEM) e biologia celular na UEL. Atualmente, é professora de fisiologia humana na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e a mente criativa por trás do MK Fisiologia.
Apaixonada pela docência, Mirian adora dar aulas de fisiologia, mas de um jeito mais descontraído e se diverte muito ensinando fisiologia. Ela está sempre buscando aprender algo novo não só sobre fisiologia, mas sobre qualquer coisa sobre a vida, o universo e tudo mais. Por isso, é uma consumidora compulsiva de conteúdos de divulgadores científicos. Nas horas vagas, você pode encontrá-la na piscina, treinando e participando de competições de natação. Para Mirian, a vida só tem graça, se ela tiver desafios a serem superados. Hoje, o seu maior desafio é ajudar o maior número de estudantes a entender de verdade a fisiologia humana.



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