
OSMOSE: MOLARIDADE, OSMOLARIDADE E TONICIDADE
Este post é a transcrição da videoaula publicada em nosso canal do YouTube "[#2] OSMOSE: MOLARIDADE, OSMOLARIDADE E TONICIDADE".
TRANSCRIÇÕESFISIOLOGIA CELULAR
Mirian Kurauti
8/12/202412 min read
Se você tá estudando osmose na fisiologia, você provavelmente já deve ter se deparado com os termos: molaridade, osmolaridade e tonicidade. Mas o que significa exatamente cada um desses termos? Nesse vídeo a gente vai explicar com detalhes o que é molaridade, osmolaridade e tonicidade.
E aí pessoal, tudo bem com vocês?
Eu sou Mirian Kurauti, professora, mestre, doutora e criadora do canal MK Fisiologia, um canal que tem como principal objetivo descomplicar a fisiologia. Então se você tá precisando entender de verdade a fisiologia, já se inscreve no canal e ative as notificações pra você não perder os próximos vídeos que a gente postar por aqui.
Agora bora tentar entender o que é molaridade, osmolaridade e tonicidade?
No vídeo anterior, a gente explicou o conceito de osmose que é basicamente o movimento de água através de uma membrana semipermeável (permeável à água, mas impermeável aos solutos), e esse movimento de água ocorre a favor do gradiente de concentração da água, isto é, do lado onde tem menos solutos e mais água, em direção ao lado onde tem mais solutos e menos água.
Portanto, não se esqueça que é a diferença de concentração dos solutos aos quais a membrana é impermeável, que direciona o movimento de água através de uma membrana semipermeável. Mas como exatamente a gente mede a concentração dos solutos?
Bom, a gente poderia medir a concentração do soluto em peso do soluto por volume de água. Por exemplo, imagine que no compartimento 1 eu coloquei 182 gramas de manitol, um tipo açúcar, em um litro de água, essa solução terá a concentração de 182 gramas por litro (g/L). E no compartimento 2 eu coloquei 58 gramas de cloreto de sódio (NaCl) em um litro de água. Essa solução terá então a concentração de 58 g/L.
Considerando que a membrana que separa esses dois compartimentos é impermeável a esses solutos, e considerando ainda a concentração em gramas/Litro desses solutos, você acha que vai ter movimento efetivo de água através da membrana?
Bom, se tem diferença de concentração, você provavelmente vai dizer que sim, e que a água se move do compartimento 2, onde tem menos solutos e mais água, pro compartimento 1, onde tem mais solutos e menos água, certo?
Errado. Na verdade, a água se move do compartimento 1 pro compartimento 2.
"Oxi professora, como assim?"
Presta atenção, que o importante não é o peso do soluto, mas sim o número de moléculas do soluto por volume de água.
"Tá professora, mas como faz pra eu saber o número de moléculas de manitol em 182 gramas e o número de moléculas de cloreto de sódio em 58 gramas?"
Bom, aí você vai ter saber o peso molecular do manitol e do cloreto de sódio. O peso molecular do manitol é aproximadamente 182 gramas, isso significa que em 182 gramas eu tenho 1 mol de manitol. Mas quantas moléculas tem 1 mol de manitol?
Lembre-se que 1 mol de qualquer molécula equivale ao número de Avogrado, ou seja, 6.022 x 10^23 moléculas. Então a solução do compartimento 1 tem 1 mol de manitol por litro de água, ou seja, a concentração da solução do compartimento 1 é de 1 molar (1 M). E é isso que a gente chama de molaridade, uma unidade de concentração dos solutos medida em mol/L ou simplesmente em molar (M).
Agora que a gente converteu a concentração do manitol em molar, vamos converter a concentração do cloreto de sódio também em molar. O peso molecular do cloreto de sódio é aproximadamente 58 gramas, isso significa que em 58 gramas eu tenho 1 mol de cloreto de sódio, ou seja, em 58 gramas de cloreto de sódio também tem 6.022 x 10^23 moléculas, e a concentração em molar dessa solução também de 1 mol/L ou 1 M de cloreto de sódio.
"Ué professora, as duas soluções têm a mesma molaridade, tem o mesmo número de moléculas, então não tem diferença de concentração de moléculas. Mas você falou que a água ia se mover do compartimento 2 pro compartimento 1, não entendi?"
Presta atenção porque aqui entra mais uma informação importante. O manitol é um açúcar formado por átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio ligados por ligação covalente, e quando colocado na água, esses átomos não se desligam, não se dissociam.
Já o cloreto de sódio é formado por um átomo de cloro e um átomo de sódio ligados por ligação iônica, e quando colocado na água esses átomos se dissociam, ou melhor, se ionizam formando os íons sódio (Na+) e cloreto (Cl-). Portanto, na solução de 1 M de cloreto de sódio, na verdade tem 1 M de íon sódio e 1 M de íon cloreto. E a molaridade total dessa solução é igual a 2 M.
Quando a gente considera a molaridade total de uma solução, a gente não usa mais a molaridade como unidade de medida da concentração dos solutos, a gente usa a osmolaridade como unidade de medida dessa concentração. Então, a osmoslaridade nada mais é do que a molaridade total de uma solução medida em osmol/L ou osmolar (osM).
1 M de manitol é igual a 1 osmolar (1 osM), mas 1 M de cloreto de sódio, como vimos, é igual a 2 osmolar (2 osM). Então agora sim, perceba que no compartimento 2 tem o dobro de moléculas comparado ao compartimento 1, logo a água vai se mover do compartimento 1, onde tem menos soluto e mais água, pro compartimento 2 onde tem mais soluto e menos água. Ou seja, a osmose depende da diferença da molaridade total, ou seja, da diferença da osmolaridade entre os compartimentos separados por uma membrana semipermeável.
"Tá professora, então a osmose só vai acontecer quando a osmolaridade for diferente nos compartimentos que tiverem separados por uma membrana semipermeável, certo?"
Certo.
"Mas qual a aplicação desse conhecimento nas células do organismo humano?"
Pra entender a aplicação desse conhecimento, vamos pegar uma célula do sangue, um eritrócito, mais conhecido como hemácia.
Assim como qualquer célula do organismo humano, a hemácia é envolta por uma membrana semipermeável, a membrana plasmática que separa basicamente dois compartimentos: um compartimento intracelular que é preenchido por uma solução que a gente chama de líquido intracelular (LIC) ou citosol, e um compartimento extracelular que é preenchido por uma solução que a gente chama de líquido extracelular (LEC).
A osmolaridade do citosol, ou do líquido intracelular, fica em torno de 290 mosM, mas a gente arredonda pra 300 mosM.
Obs. Pra quem não sabe, mosM e osM é igual milímetros e metros, 1000 mm é igual a 1 metro, 1000 mosM é igual a 1 osM, então 300 mosM seria igual a 0,3 osM.
Então vamos lá, quando o líquido extracelular tem a mesma osmolaridade que o líquido intracelular, ou seja, 0,3 osM, dizemos que o líquido extracelular é isosmótico ao liquido intracelular, pois a osmolaridade é igual, e não vai ter movimento efetivo de água através da membrana plasmática da hemácia. Como a água nem entra e nem sai, o volume da hemácia não se altera, e por isso a gente pode dizer também que o líquido extracelular é isotônico, ou seja, apresenta a mesma tonicidade do líquido intracelular.
"Mas e se o líquido extracelular aumentar a sua osmolaridade de 0,3 pra 0,35 osM?"
Agora, a osmolaridade do líquido extracelular vai ser maior que a osmolaridade do líquido intracelular, ou seja, o líquido extracelular vai ser hiperosmótico comparado ao líquido intracelular, e água agora vai se mover, através da membrana plasmática, do líquido intracelular que tem menos solutos e mais água, pro líquido extracelular que tem mais solutos e menos água, até que as osmolaridades se igualem nos dois lados da membrana. Nesse caso, a água sai da célula, a célula perde água, e o volume da célula diminui, ela murcha, e por isso a gente pode dizer que o líquido extracelular agora vai ser hipertônico, ou seja, apresenta uma tonicidade maior do que a do líquido intracelular.
"Mas e se o líquido extracelular diminuir a sua osmolaridade de 0,3 pra 0,25 osM?"
Agora a osmolaridade do líquido extracelular vai ser menor que a osmolaridade do líquido intracelular, ou seja, o líquido extracelular vai ser hiposmótico comparado ao líquido intracelular, e água agora vai se mover, através da membrana plasmática, do líquido extracelular que tem menos solutos e mais água, pro líquido intracelular que tem mais solutos e menos água, até que as osmolaridades se igualem nos dois lados da membrana. Nesse caso, a água entra na célula, a célula ganha água, e o volume da célula aumenta, ela incha, e por isso a gente pode dizer que o líquido extracelular agora vai ser hipotônico, ou seja, apresenta uma tonicidade menor do que a do líquido intracelular.
Portanto, não se esqueça que quando a gente fala em tonicidade de uma solução, a gente fala em movimento efetivo da água através da membrana plasmática das células.
Se uma célula tá em meio isotônico, não ocorre osmose e o volume da célula não se altera.
Se uma célula tá em meio hipertônico, ocorre osmose, a água sai da célula, e o volume da célula diminui, a célula murcha, e pode ocorrer o que chamamos de crenação, considerando as hemácias, o que pode causar a morte dessas células.
E se uma célula tá em meio hipotônico, ocorre osmose, mas a água entra na célula, e o volume da célula aumenta, a célula incha e a membrana plasmática da célula pode até se romper, meio que “explodindo” a célula, o que a gente chama de hemólise, considerando as hemácias.
Por isso é importante entender que a osmose, ou seja, que o movimento efetivo de água através da membrana plasmática das células, depende da osmolaridade e tonicidade do meio em que ela se encontra, no caso, da osmolaridade e tonicidade do líquido extracelular.
Em condições normais, esse líquido é isosmótico e isotônico, mas quando o organismo perde muita água, o líquido extracelular pode ficar mais concentrado, ou seja, hiperosmótico e hipertônico e as células podem murchar até o ponto de causar danos irreversíveis nas células. E quando o organismo ganha muita água, o líquido extracelular pode ficar mais diluído, ou seja, hiposmótico e hipotônico e as células podem inchar até o ponto de “explodirem”, o que não é nada bom né?
Portanto, é extremamente importante manter o líquido extracelular isosmótico e isotônico pra evitar alterações no volume das células provocadas pelo movimento de água através da membrana plasmática, ou seja, provocadas pela osmose. E é por isso que quando a gente precisa administrar algum fármaco direto na veia, isto é, pela via intravenosa, geralmente esse fármaco é colocado em uma solução salina ou soro fisiológico, que contém 0,9% de cloreto de sódio, isto é, 0,9 gramas de cloreto de sódio diluído em 100 ml de água, o que equivale a 9 g/L.
Vamos transformar essa concentração em osmolaridade?
Lembra que 58 gramas de cloreto de sódio é igual a 1 M? Então, por regra de três, 9 gramas é igual a 0,15 M. E como o cloreto de sódio se dissocia na água em íons sódio e cloreto, a gente tem 0,15 M de íons sódio e 0,15 M de íons cloreto. Logo, a molaridade total, ou melhor, a osmolaridade dessa solução é igual a 0,3 osM, que olha só, é o valor aproximado da osmolaridade do líquido intracelular, ou seja, o soro fisiológico é uma solução isosmótica e isotônica.
"Professora, então sempre que uma solução for isosmótica ela vai ser isotônica, certo?"
É aí que mora o perigo. Dá só uma olhada nessa tabela contendo as principais soluções administradas pela via intravenosa. Repare que uma solução de dextrose 5% que nada mais é do que uma solução de glicose 5%, é uma solução isosmótica, ou seja, a osmolaridade dessa solução é de 0,3 osM, mas ela não é isotônica, ela é hipotônica.
"Como assim?"
Aqui você precisa prestar atenção porque o cloreto de sódio é considerado um soluto impermeável pois mesmo que o sódio entre nas células ele é bombeado de volta pro líquido extracelular pela bomba de Na+/K+, mas a glicose não é um soluto impermeável, a glicose que entra nas células não é bombeada de volta pra fora. Então veja bem o que acontece, quando eu coloco uma célula em uma solução de glicose 5% com osmolaridade de 0,3 osmM.
A glicose entra por difusão facilitada graças a presença de transportadores de glicose do tipo GLUT, até que as concentrações da glicose se igualem nos dois lados da membrana. Mas lembra que dentro da célula já tinha 0,3 osM de solutos impermeáveis, que não atravessavam a membrana, então agora junto com esses 0,3 osM desses solutos, a gente soma 0,15 osM da glicose que entrou.
Dentro da célula agora tem 0,45 osM e fora da célula apenas 0,15 osM, e por isso vai ter osmose, a água vai entrar na célula, a célula vai ganhar volume, vai inchar e portanto a solução de glicose 5%, embora seja isosmótica, ela é hipotônica. E é por isso que normalmente quando uma pessoa precisa de glicose na veia, a gente aplica uma solução de dextrose 5% em solução salina 0,9%, ou melhor, em soro fisiológico, porque aí eu vou ter 0,3 osM que não entra na célula, e então mesmo quando a glicose equilibrar a sua concentração nos dois lados da membrana, a osmolaridade vai ser igual nos dois lados, e não ocorrerá movimento efetivo de água, e as células não vão alterar o seu volume.
"Ah então quer dizer que essas soluções hipotônicas não servem pra nada?"
Claro que serve, imagine se uma pessoa chega extremamente desidratada com as suas células tudo murchas? Pra eu hidratar rapidamente as células dessa pessoa eu posso usar uma solução hipotônica, que vai provocar entrada de água nas células, reestabelecendo assim o seu volume.
Bom então resumindo tudo o que a gente viu nesse vídeo lembre-se que:
A molaridade é uma unidade de medida de concentração dos solutos de uma solução que leva em consideração o número de moléculas ou mol por litro de água.
Quando a molécula se dissocia na água, é preciso leva em consideração a molaridade de cada partícula dissociada e a soma das molaridades dessas partículas dissociadas é o que chamamos de molaridade total ou osmolaridade.
Portanto, é a osmolaridade que devemos considerar para saber se ocorrerá osmose ou não.
Quando uma célula é colocada em solução isosmótica, cujos solutos não atravessam a membrana, a célula não altera o volume e a solução é isotônica.
Quando uma célula é colocada em solução hiperosmótica, cujos solutos não atravessam a membrana, a célula perde água, diminui o volume, e a solução é hipertônica.
E quando uma célula é colocada em solução hiposmótica, cujos solutos não atravessam a membrana, a célula ganha água, aumenta o volume, e a solução é hipotônica.
E por fim, mas não menos importante, não se esqueça que se um dos solutos de uma solução consegue atravessar a membrana plasmática das células, como é o caso da glicose, você precisa tomar cuidado, pois nesse caso, nem toda solução isosmótica será necessariamente uma solução isotônica.
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Bom, a gente vai ficando por aqui. Qualquer dúvida pode deixar aí nos comentários que a gente tenta responder, beleza? A gente se vê num próximo vídeo. Abraço!


Sobre a autora
Mirian Ayumi Kurauti é apaixonada pela fisiologia, com uma trajetória acadêmica admirável. Ela se formou em Biomedicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), fez mestrado e doutorado em Biologia Funcional e Molecular com ênfase em Fisiologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e ainda atuou como pesquisadora de pós-doutorado na mesma instituição. Além disso, já lecionou fisiologia humana na Universidade Estadual de Maringá (UEM) e biologia celular na UEL. Atualmente, é professora de fisiologia humana na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e a mente criativa por trás do MK Fisiologia.
Apaixonada pela docência, Mirian adora dar aulas de fisiologia, mas de um jeito mais descontraído e se diverte muito ensinando fisiologia. Ela está sempre buscando aprender algo novo não só sobre fisiologia, mas sobre qualquer coisa sobre a vida, o universo e tudo mais. Por isso, é uma consumidora compulsiva de conteúdos de divulgadores científicos. Nas horas vagas, você pode encontrá-la na piscina, treinando e participando de competições de natação. Para Mirian, a vida só tem graça, se ela tiver desafios a serem superados. Hoje, o seu maior desafio é ajudar o maior número de estudantes a entender de verdade a fisiologia humana.



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