Introdução à fisiologia: O QUE É HOMEOSTASE ou HOMEOSTASIA?

Acesse gratuitamente a transcrição da videoaula publicada em nosso canal do YouTube "Introdução à Fisiologia Humana: O que é homeostase?".

TRANSCRIÇÕES

Mirian Kurauti

7/9/202410 min read

E aí pessoal, tudo bem com vocês?

Pra quem não me conhece meu nome é Mirian, sou biomédica, mestre, doutora e professora de fisiologia. E neste vídeo, eu começo aqui nesse canal uma série de videoaulas sobre fisiologia humana. Então se você quiser acompanhar todas as aulas, se inscreva no canal e ative as notificações.

Bom, então antes de mais nada, pra gente começar a falar sobre fisiologia, a gente precisa entender o que essa subárea da biologia estuda.

Pra tentar explicar o que é fisiologia vamos começar com o que está acontecendo agora no seu organismo.

Enquanto você tá aí sentado assistindo esse vídeo, o seu coração que é um músculo, tá se contraindo, bombeando sangue pra todos os órgãos do seu corpo. Ao mesmo tempo, um ar rico em oxigênio tá entrando nos seus pulmões e, em troca, um ar pobre em oxigênio e rico em gás carbônico tá sendo jogado pra fora dos seus pulmões. Daqui a pouco pode bater aquela fome, e aí você para pra fazer aquele miojo especial. E conforme você se alimenta, o miojo vai sendo digerido e absorvido no seu trato gastrointestinal. Os nutrientes absorvidos então entram na circulação sanguínea, e podem finalmente ser distribuídos pra todas as células do seu organismo.

Nesse momento, a gente pode fazer algumas perguntas interessantes, como por exemplo:

"Como o coração bombeia o sangue? Como o ar entra e sai dos pulmões? Como os alimentos são digeridos e absorvidos no trato gastrointestinal?"

Bom, se você quiser saber a respostas de todas essas perguntas, você precisa estudar fisiologia, pois essa subárea da biologia visa estudar, basicamente, o funcionamento de um organismo vivo.

Então, se a gente quiser falar sobre o organismo humano, a gente tem a fisiologia humana, que é o nosso foco aqui.

Mas, vale lembrar que a gente também tem a fisiologia animal, que estuda o funcionamento de outros organismos animais, e a fisiologia vegetal que estuda o funcionamento dos organismos vegetais.

Resumindo, a fisiologia é a base pra gente começar a entender o funcionamento de qualquer organismo vivo.

Um ponto importante para começar a estudar a fisiologia, é saber que todas as funções de um organismo vivo, é conduzido pelos princípios básicos da química e da física. Por exemplo, quando o alimento ingerido entra no trato gastrointestinal, ele será digerido (ou quebrado em pequenos pedaços) pelas enzimas digestivas, que catalisam as reações químicas. Por outro lado, quando o coração cheio de sangue contrai, cria-se uma pressão no seu interior, e essa força física deve ser grande o suficiente para bombear o sangue pra todos os seus vasos sanguíneos.

Até aqui, você já pode estar imaginando que aprender todo o funcionamento do organismo humano, não deve ser muito fácil, mas aqui a gente tenta simplificar, principalmente pra galera que tá aí na graduação e precisa aprender o básico da fisiologia humana.

Então, sem perder muito tempo, vamos direto ao ponto. Pra gente começar a entender como o nosso organismo funciona, precisamos entender o que é homeostase ou homeostasia. E pra isso, primeiro a gente precisa relembrar como o organismo humano é estruturado.

Então de maneira resumida, a gente pode dizer que a manutenção do organismo humano é resultado do funcionamento de complexos sistemas orgânicos, como por exemplo, sistema nervoso, cardiovascular, respiratório e o sistema renal, que está ilustrado aqui nessa figura (ver figura no vídeo).

Cada sistema é formado por órgãos, por exemplo, no caso do sistema renal, rins, bexiga e dois canais por onde passam a urina, ureter e uretra. Cada órgão é formado por dois ou mais tipos de tecidos diferentes. O rim por exemplo é constituído por tecido epitelial, tecido conjuntivo, tecido nervoso e tecido muscular. Cada um desses tecidos, são, por sua vez, formados por um aglomerado de células especializadas (como as células epiteliais, células de tecido conjuntivo, neurônios e células musculares).

Individualmente, as células são capazes de realizar todas as funções básicas de um organismo vivo, sendo, portanto, consideradas as menores unidades vivas de um organismo.

Uma célula contém diversas organelas e o núcleo, o qual contém o material genético, que determina as funções celulares. Todo o espaço intracelular (chamado de citoplasma), é preenchido por uma solução composta por água, eletrólitos e outras substâncias, constituindo o chamado Líquido Intracelular (LIC).

Assim como o espaço intracelular, o espaço extracelular que circunda as nossas células, também é preenchido por uma solução contendo água, eletrólitos e outras substâncias, constituindo o que chamamos de Líquido Extracelular (LEC).

Separando esses dois líquidos, ou esses dois compartimentos, nós temos a membrana plasmática também chamada de membrana celular.

Assim, podemos dizer que todo o líquido de um organismo, ou o líquido corporal total está contido nesses dois grandes compartimentos delimitados pela membrana celular:

  1. um compartimento intracelular (contendo dois terços dos líquidos corporais, o LIC,

  2. e outro extracelular (contendo um terço dos líquidos corporais, o LEC).

Ainda vale destacar que o LEC, é subcompartimentalizado, e 80% desse líquido extracelular encontra-se no espaço intersticial, ou seja, no espaço entre os tecidos, entre as células, constituindo assim o chamado líquido intersticial.

Os outros 20% encontram-se dentro dos vasos sanguíneos, constituindo a parte líquida do sangue, ou seja, o plasma.

Em um indivíduo adulto do sexo masculino, aproximadamente 70% do seu peso é constituído por líquidos. Portanto, se considerarmos um homem de 70 kg, ele terá aproximadamente 42 litros de líquido corporal.

Desses 42 litros, 28 litros estarão dentro das células (constituindo o LIC), e 14 litros fora das células (constituindo o LEC), sendo 11 litros distribuídos no espaço intersticial e 3 litros dentro dos vasos sanguíneos, formando o plasma.

É importante deixar claro que embora os líquidos estejam separados por barreiras (ou seja, as membranas celulares, separando o LIC e o LEC, e a parede dos vasos separando o líquido intersticial do plasma). Essas barreiras permitem a passagem de algumas substâncias como água, nutrientes, eletrólitos, gases e resíduos metabólicos.

Assim, essas substâncias estão em constante movimento entre o LIC e o LEC, e entre o LEC e o meio externo.

"Mas, o que seria esse meio externo?"

Esse tal de meio externo, é o meio ambiente no qual o nosso organismo como um todo está inserido, ou seja, o meio ambiente que nos envolve fisicamente.

Dessa forma, o LEC funciona como uma interface, mediando as trocas de todos esses componentes e outras substâncias entre o meio externo e o LIC. Portanto, podemos dizer que o LEC é o meio ambiente que das nossas células, e chamamos esse meio de “meio interno”, pra diferenciar do “meio externo” que nos envolve.

Este termo (meio interno do francês, “millieu intérieur”), foi utilizado pela primeira vez pelo fisiologista francês Claude Bernard, no século XIX, ao se referir ao meio líquido que envolve os tecidos e as células, hoje conhecido como LEC.

Ainda naquela época, Bernard observou que nos animais de vida constante, ou seja, animais cuja vida pode continuar independente das variações do meio externo, como é o caso dos seres humanos, as condições físicas do meio interno permanecem praticamente constantes mesmo diante de grandes variações do meio externo.

Por exemplo, se nós estivermos no frio da Antártida ou no calor do Deserto do Saara, a temperatura do nosso meio interno, tende a continuar próximo de trinta e sete graus. Ou seja, é como se as nossas células tivessem se instalado dentro de uma “estufa” própria, e as infinitas mudanças do meio externo não as afetam diretamente.

Dessa forma, a vida das nossas células não fica presa às mudanças do meio que está fora da estufa e, portanto, a nossa vida é livre e independente das variações do meio externo.

Assim, Bernard propôs, que essa fixidez (ou constância) do meio interno era a condição mínima para se ter uma vida livre e independente.

Portanto, nos animais de vida livre e independente, o organismo evoluiu pra ser capaz de compensar qualquer alteração do meio externo, mantendo as condições do meio interno constante ou melhor quase constante.

Agora, a pergunta que fica é:

"Quais são essas condições do meio interno? E o que significa dizer que essas condições são quase constantes?"

Respondendo a primeira questão: condições do meio interno, são as variáveis físicas e químicas do LEC, ou seja, a temperatura, a pressão, a concentração de oxigênio e nutriente, e assim por diante.

E respondendo a segunda questão: essas condições são quase constantes, ou seja, não estão sempre em um valor fixo, mas sim dentro de um intervalo de valores necessários pra sobrevivência das células.

Por exemplo, a temperatura do meio interno não fica fixa em trinta e sete graus, na verdade ela varia entre trinta e seis e trinta e sete graus ao longo do dia. E essa variação é normal e vale pra qualquer variável do meio interno, como a concentração de oxigênio e nutrientes, por exemplo.

Depois de Claude Bernard, já no século XX, Walter Cannon (um fisiologista americano) criou um termo pra se referir a essa condição quase constante do meio interno:

Homeostase ou Homeostasia (vocês podem encontrar esses dois termos nos livros, é a mesma coisa).

Esse termo vem do grego, homeo, que significa similar, e stasis, que significa condição. Portanto, definindo o termo Homeostase, nós temos uma “condição similar” ou uma condição quase constante do meio interno.

Dessa forma, é importante ficar claro que Homeostase é um estado dinâmico e não estático.

Pegamos como exemplo a homeostase da glicose. Ao longo de um dia a sua concentração no sangue pode sofrer alterações após as refeições. Nessas refeições, os carboidratos ingeridos, são digeridos e absorvidos pelo sistema digestório, elevando as concentrações do principal carboidrato no sangue, a glicose. Porém a concentração de glicose no sangue cai rapidamente graças a mecanismos compensatórios (no caso, a secreção do hormônio insulina pelo pâncreas), mantendo as concentrações de glicose dentro de um limite adequado pra sobrevivências das células, em outras palavras, mantendo a homeostase dessa variável.

Porém, quando os mecanismos compensatórios falham, a homeostase pode ser perdida e as concentrações de glicose no sangue podem ultrapassar os limites de variação normal, estabelecendo agora uma condição não saudável, ou seja, uma doença, nesse caso o Diabetes.

Nos diabéticos, o que acontece é uma falha na secreção de insulina, e a concentração de glicose no sangue pode permanecer em concentração bastante elevada, após a ingestão de setenta e cinco gramas de glicose, quando comparado com um indivíduo saudável (ou seja, quando comparado com um indivíduo que está em homeostase). É essa alta concentração de glicose que causa praticamente todos os efeitos deletérios do diabetes.

É importante deixar claro que, assim como há mecanismos compensatórios pra manter as concentrações de glicose em homeostase, há mecanismos compensatórios pra manter qualquer uma das variáveis do meio interno em homeostase.

Pra quem ainda não entendeu, vamos tentar explicar de outra maneira.

Um organismo em homeostase, está passível de sofrer diversas alterações no seu meio interno. Por exemplo, um aumento da temperatura pode acontecer, seja devido a alterações externas (como acontece num dia muito quente), ou internas (como acontece quando há produção de calor devido a uma atividade física, por exemplo).

Em qualquer uma das situações, o organismo ativa mecanismos compensatórios pra resfriar o meio interno (nesse caso, estimula-se a produção de suor, por exemplo). Se a evaporação do suor conseguir reestabelecer a temperatura, o organismo continua saudável (em homeostase), caso contrário, se os mecanismos compensatórios falharem ou se a alteração for tão grande que os mecanismos compensatórios não conseguem dar conta, o organismo ficará doente (pode ocorrer uma hipertermia, e a temperatura permanecerá acima do limite normal, o que prejudica o funcionamento das células). Se essa alteração for muito grave e prolongada, poderá ocasionar até mesmo a morte do indivíduo.

Portanto, deve ficar claro que pra manter o organismo vivo, funcionando adequadamente, é preciso manter a homeostase de todas as variáveis do meio interno; e isso acontece graças aos mecanismos compensatórios que buscam manter a homeostase de uma determinada variável. Sendo assim, esses mecanismos, também podem ser chamados de mecanismos homeostáticos.

Não próxima videoaula, a gente explica quem são esses mecanismos homeostáticos, beleza pessoal? Então não percam o próximo vídeo!

Resumindo tudo que vimos nessa videoaula, lembrem-se que:
  • O meio interno é o líquido extracelular ou LEC, ou seja, o meio líquido no qual as células ficam imersas.

  • As condições desse meio interno (por exemplo, a. temperatura, concentração de oxigênio e nutrientes presentes no LEC) devem se manter dentro de um limite de valores, ou seja, deve ser mantido quase constante.

  • Esse estado de manutenção do meio interno quase constante é chamado de homeostase.

  • Alterações na homeostase de uma variável do meio interno, deverá ser reestabelecida pelos mecanismos homeostáticos; caso contrário uma doença poderá se instalar.

Se vocês ficaram com alguma dúvida, pode deixar aí nos comentários que a gente tenta responder sempre, beleza? A gente se vê no próximo vídeo, valeu? Um abraço e até mais!

Sobre a autora

Mirian Ayumi Kurauti é apaixonada pela fisiologia, com uma trajetória acadêmica admirável. Ela se formou em Biomedicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), fez mestrado e doutorado em Biologia Funcional e Molecular com ênfase em Fisiologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e ainda atuou como pesquisadora de pós-doutorado na mesma instituição. Além disso, já lecionou fisiologia humana na Universidade Estadual de Maringá (UEM) e biologia celular na UEL. Atualmente, é professora de fisiologia humana na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e a mente criativa por trás do MK Fisiologia.

Apaixonada pela docência, Mirian adora dar aulas de fisiologia, mas de um jeito mais descontraído e se diverte muito ensinando fisiologia. Ela está sempre buscando aprender algo novo não só sobre fisiologia, mas sobre qualquer coisa sobre a vida, o universo e tudo mais. Por isso, é uma consumidora compulsiva de conteúdos de divulgadores científicos. Nas horas vagas, você pode encontrá-la na piscina, treinando e participando de competições de natação. Para Mirian, a vida só tem graça, se ela tiver desafios a serem superados. Hoje, o seu maior desafio é ajudar o maior número de estudantes a entender de verdade a fisiologia humana.

Foto da autora do post Mirian Ayumi Kurauti criadora do MK Fisiologia
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