[#5] EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE: Acidose e Alcalose | Diagrama de Davenport

Este post é a transcrição da videoaula publicada em nosso canal do YouTube "[#5] EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE: Acidose e Alcalose | Diagrama de Davenport".

TRANSCRIÇÕESEQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

Mirian Kurauti

2/14/202511 min read

O pH normal ou fisiológico do líquido extracelular, ou melhor, do sangue arterial, fica entre 7,35 e 7,45. Porém, se o organismo ganha muito ácido ou perde muita base, o equilíbrio ácido-base é alterado e o pH pode chegar a valores abaixo de 7,35 um distúrbio ácido-base que a gente chama de acidose. Por outro lado, se o organismo perde muito ácido ou ganha muita base, o equilíbrio ácido-base também é alterado, e o pH pode chegar a valores acima de 7,45 um distúrbio ácido-base que a gente chama de alcalose.

Tanto a acidose como a alcalose podem ser classificadas como respiratória ou metabólica. Portanto, nesse vídeo a gente vai falar um pouco sobre acidose e alcalose respiratória, e acidose e alcalose metabólica.

E aí pessoal, tudo bem com vocês?

Pra quem tá chegando agora e ainda não me conhece, eu sou Mirian Kurauti aqui do canal MK Fisiologia, um canal que tem como principal objetivo descomplicar a fisiologia humana. Então, se você tá precisando entender de verdade a fisiologia, já se inscreve no canal e ative as notificações pra você não perder os próximos vídeos que a gente postar por aqui.

Agora, bora tentar entender a acidose e a alcalose respiratória e metabólica?

No vídeo anterior, a gente viu que de acordo com a equação de Henderson-Hasselbalch, se a concentração de gás carbônico aumenta e/ou se a concentração de bicarbonato diminui, o pH diminui podendo levar a uma acidose. Mas se a concentração de gás carbônico diminui e/ou a concentração de bicarbonato aumenta, o pH aumenta podendo levar a uma alcalose.

Agora uma coisa que a gente não falou no vídeo anterior é que se a acidose ou a alcalose forem iniciadas devido a uma alteração da concentração de gás carbônico, a acidose ou a alcalose será respiratória. Mas se esses distúrbios ácido-base forem iniciados devido a uma alteração da concentração de bicarbonato, a acidose ou a alcalose será metabólica.

Por exemplo, quando a eliminação de gás carbônico diminui, como acontece em casos de diminuição da ventilação alveolar e/ou diminuição do fluxo sanguíneo nos pulmões, ou melhor, diminuição da perfusão pulmonar, e também em casos de diminuição da capacidade de difusão dos gases entre os alvéolos e os capilares pulmonares, a concentração, ou melhor, a pressão parcial de gás carbônico no sangue arterial pode aumentar causando uma acidose respiratória. E quando a eliminação de gás carbônico aumenta, como acontece em casos de aumento da ventilação alveolar, a pressão parcial de gás carbônico pode diminuir causando alcalose respiratória.

Agora, uma coisa importante que você precisa saber é que, além do gás carbônico ou ácido carbônico, que são considerados ácidos voláteis, a gente também tem os ácidos não voláteis ou ácidos fixos, como por exemplo o ácido clorídrico, o ácido lático, o ácido acetoacético (um corpo cetônico) e o ácido beta-hidroxibutírico (um outro corpo cetônico).

Quando a eliminação desses ácidos fixos diminui, ou quando a produção desses ácidos fixos aumenta, o bicarbonato é consumido pra neutralizar esse excesso de ácidos fixos e a sua concentração diminui causando uma acidose metabólica.

Além disso, a concentração de bicarbonato também pode diminuir por causa de uma perda excessiva desse íon, como acontece em casos de diarreia severa, aquelas que você caga até a alma, sabe? Nesse caso, como a concentração de bicarbonato também diminui, a gente também pode ter uma acidose metabólica.

Por outro lado, quando você ganha muito bicarbonato, como pode acontecer se você tomar muito antiácido, ou quando você perde muitos ácidos fixos, como por exemplo o ácido clorídrico secretado pelo estômago que pode ser perdido durante um quadro de vômito severo, a concentração de bicarbonato aumenta causando alcalose metabólica.

Agora, uma outra coisa importante que você precisa saber é que tanto a acidose quanto a alcalose, respiratória e metabólica, podem ser estudadas usando um diagrama que nada mais é do que uma representação gráfica da equação de Henderson-Hasselbalch, que relaciona a pressão parcial de gás carbônico, a concentração de bicarbonato e o pH do sangue arterial.

Esse diagrama é conhecido como o diagrama pH-bicarbonato ou diagrama de Davenport.

Calma, não se desespere. Eu sei que esse diagrama parece super complicado, mas ele não é. Então, pra descomplicar, vamos montar esse diagrama do zero.

-Tá, professora, mas por onde a gente começa?

A gente começa do ponto normal, do ponto fisiológico, em que o pH é igual a 7,4 e a concentração de bicarbonato é igual a 24 milimolar (mM). Nesse ponto, de acordo com a equação de Henderson-Hasselbalch, a pressão parcial de gás carbônico é igual a 40 mmHg.

Pronto, temos o ponto inicial do diagrama de Davenport.

Agora, a partir desse ponto, usando a equação de Henderson-Hasselbalch, a gente pode prever o que acontece nos distúrbios ácido-base metabólicos causados pelo aumento ou pela diminuição da concentração de bicarbonato.

Pra isso, basta a gente fixar a pressão parcial de gás carbônico em 40 mmHg e ir alterando a concentração de bicarbonato pra mais ou pra menos, pra ver como o pH vai ser alterado pra mais ou pra menos, obtendo assim uma curva pH-bicarbonato pra quando a pressão parcial de gás carbônico for igual a 40 mmHg.

E aí, com essa curva a gente consegue rapidamente prever o que acontece com o pH quando apenas a concentração de bicarbonato aumenta ou diminui.

Por exemplo, quando a concentração de bicarbonato aumenta de 24 pra cerca de 50 mM, o pH sobe pra 7,7 e a gente vai ter aqui uma alcalose metabólica. E quando a concentração de bicarbonato diminui de 24 pra 12 mM, o pH cai pra 7,1 e a gente vai ter aqui uma acidose metabólica.

Mas agora, e se a gente alterar a pressão parcial de gás carbônico pra simular uma condição de acidose e alcalose respiratória?

Bom, se a gente fixar a pressão parcial de gás carbônico agora em 80 mmHg, a gente pode obter uma nova curva pH-bicarbonato, assim como se a gente fixar a pressão parcial de gás carbônico em 20 mmHg. E aí, a partir do ponto inicial, normal, do diagrama, a gente pode ver o que acontece com o pH quando a pressão parcial de gás carbônico sobe pra 80 ou desce pra 20 mmHg.

Agora, presta bastante atenção aqui. Se no sangue arterial só tivesse o sistema tampão bicarbonato, quando a pressão parcial de gás carbônico aumentasse de 40 pra 80 mmHg, a reação química do ácido carbônico deslocaria no sentido de aumentar tanto a concentração de H+, como a concentração de bicarbonato. Só que o aumento da concentração de H+ seria muito mais significativo do que o aumento da concentração de bicarbonato, que praticamente iria permanecer em torno de 24 mM.

Portanto, nesse caso, segundo a equação de Henderson-Hasselbalch, se a pressão parcial de gás carbônico aumentasse de 40 pra 80 mmHg, o pH diminuiria de 7,4 pra 7,1 e a gente teria aqui uma acidose respiratória.

Mas se a pressão parcial de gás carbônico diminuísse de 40 pra 20 mmHg, a reação química do ácido carbônico deslocaria no sentido de diminuir tanto a concentração de H+, como a concentração de bicarbonato. Porém, lembre-se que, quando a gente só tem esse sistema tampão no sangue arterial, a diminuição da concentração de H+ é muito mais significativa do que a diminuição da concentração de bicarbonato, que praticamente iria permanecer em torno de 24 mM.

Portanto, nesse caso, segundo a equação de Henderson-Hasselbalch, se a pressão parcial de gás carbônico diminuísse de 40 pra 20 mmHg, o pH aumentaria de 7,4 pra 7,7 e a gente teria aqui uma alcalose respiratória.

Porém, entretanto, contudo, todavia, no sangue arterial não existe só o sistema tampão bicarbonato. Existem também outros sistemas tampão tanto extracelulares como intracelulares que podem ajudar a tamponar o pH do sangue arterial.

Agora de novo, presta bastante atenção aqui. Quando a pressão parcial de gás carbônico aumenta, a reação química do ácido carbônico é deslocada no sentido de aumentar a concentração de H+ e bicarbonato. E, como a gente viu, tanto a concentração de bicarbonato como a concentração de H+ aumenta só um pouquinho, só que esse pequeno aumento de H+ é o suficiente pra dobrar a concentração desse íon e o pH vai de 7,4 pra 7,1. Porém, esse mesmo pequeno aumento de bicarbonato é praticamente insignificante, porque o bicarbonato é muito, mas muito mais concentrado do que o H+.

Pensa em uma pessoa que só tem 100 reais. Se eu der 100 reais pra ela, o dinheiro dela dobra. Mas agora pensa em uma pessoa que tem 100 mil reais, se eu der 100 reais pra ela, esses 100 reais vão ser praticamente insignificantes perto dos 100 mil reais que ela já tem. Pegaram a ideia?

Porém, quando a gente tem outros sistemas tampão, o componente básico desses outros sistemas pode receber parte desse H+ gerado pelo aumento da pressão parcial do gás carbônico, e a reação química do ácido carbônico é deslocada ainda mais pra direita, liberando mais bicarbonato e H+.

Como parte do H+ tá sendo recebido pelo componente básico dos outros sistemas tampão, a sua concentração aumenta só um pouquinho, mas a concentração de bicarbonato agora pode aumentar de maneira mais significativa.

Então, graças à presença desses outros sistemas tampão, quando a pressão parcial do gás carbônico aumenta, pra eu saber o que acontece com o pH, ao invés de eu simplesmente traçar uma linha reta que eu faria caso só tivesse o sistema tampão bicarbonato, eu traço uma linha inclinada, a linha tampão, que representa o poder de tamponamento dos demais sistemas tampão que ajudam a tamponar o pH do sangue arterial.

Assim, quando a pressão parcial de gás carbônico aumenta de 40 pra 80 mmHg, a concentração de bicarbonato aumenta de 24 pra cerca de 35 mM,e o pH diminui, mas agora não pra 7,1 e sim pra mais ou menos 7,25 diminuindo um pouco a acidose respiratória. E quando a pressão parcial de gás carbônico diminui de 40 pra 20 mmHg, a concentração de bicarbonato diminui de 24 pra cerca de 18 mM e o pH aumenta, mas agora não pra 7,7 e sim pra 7,55 diminuindo um pouco a alcalose respiratória.

Portanto, deve ficar claro que não existe apenas o sistema tampão bicarbonato pra tamponar o pH do sangue. Existem também outros sistemas tampão, e dentre esses outros sistemas tampão do sangue, o principal é sistema tampão proteínas.

Lembre-se, as proteínas podem atuar como bases ou ácidos, recebendo ou doando H+ dependendo da concentração desse íon, funcionando assim como um sistema tampão.

Dentre as proteínas que fazem parte desse sistema tampão no sangue, a gente tem as proteínas plasmáticas, isto é, proteínas extracelulares que ficam no plasma, a parte líquida do sangue, e as proteínas intracelulares que ficam dentro das células sanguíneas, como as hemácias.

A principal proteína que fica dentro das hemácias é a famosa hemoglobina, que devido a sua grande quantidade tem um poder de tamponamento muito importante. Mas, como o foco desse vídeo é a acidose e a alcalose, respiratória e metabólica, a gente não vai ficar dando muito mais detalhes sobre o sistema tampão hemoglobina. Nesse momento, o mais importante é você pelo menos saber que esse sistema tampão hemoglobina é o principal sistema que explica a inclinação daquela linha tampão do diagrama de Davenport, beleza?

Então, resumindo até aqui, lembre-se que se a concentração de bicarbonato altera, a gente vai ter uma alcalose ou acidose metabólica. E se a pressão parcial de gás carbônico altera, a gente vai ter uma acidose ou alcalose respiratória. Mas aqui, lembre-se que o pH altera de acordo com a inclinação da linha tampão, quanto mais inclinada essa linha, maior o poder de tamponamento dos demais sistema tampão.

Em alguns livros, você pode encontrar uma linha tampão menos inclinada. Essa linha tampão menos inclinada representa o poder de tamponamento não-bicarbonato apenas do plasma, não considerando os sistemas tampão não-bicarbonato das células sanguíneas, por isso ela vai ser menos inclinada, o poder de tamponamento é menor se eu não considerar os sistemas tampão das células sanguíneas.

Mas aqui, a gente vai usar a linha tampão considerando o sangue como um todo e não apenas o plasma, porque no organismo tá tudo junto e misturado. Tanto os sistemas tampão não-bicarbonato do plasma, quanto os sistemas tampão não-bicarbonato das células sanguíneas, vão ajudar o sistema tampão bicarbonato a minimizar as alterações do pH.

Porém, embora todos esses sistemas tampão minimizem as alterações do pH, esses sistemas não tentam corrigir essas alterações. E é aqui que entram o sistema respiratório e renal.

Por exemplo, quando a gente tem uma alcalose ou acidose metabólica, o sistema respiratório regula a respiração pra regular assim a pressão parcial de gás carbônico pra mais ou pra menos, pra assim tentar corrigir ou fazer com que o pH volte pra mais próximo de 7,4.

E quando a gente tem uma acidose ou alcalose respiratória, o sistema renal pode regular principalmente a reabsorção de bicarbonato (*obs. no comentário do vídeo), pra regular assim a concentração desse íon pra mais ou pra menos, e assim tentar corrigir ou fazer com que o pH volte pra mais próximo de 7,4.

-Tá, professora, mas como que acontece exatamente essa regulação do sistema respiratório e renal pra compensar esses distúrbios ácido-base metabólicos e respiratórios?

Pra saber exatamente como acontecem essas respostas compensatórias do sistema respiratório e renal, a gente precisa entender os mecanismos homeostáticos de regulação do pH desses dois sistemas. Mas isso a gente vê nos próximos vídeos, não perca!

Bom, então resumindo, lembre-se que:

  • Todos os distúrbios ácido-base podem ser estudados utilizando o diagrama de Davenport, um diagrama que relaciona o pH do sangue arterial com sistema tampão bicarbonato e com os demais sistemas tampão.

  • Além disso, o diagrama de Davenport também pode ser utilizado pra estudar a regulação dos sistemas respiratório e renal, os quais tentam compensar dos distúrbios ácido-base pra manter o pH o mais próximo possível de 7,4.

  • Por fim, mas não menos importante, vale lembrar que aqui a gente só falou o basicão dos distúrbios ácido-base e do diagrama de Davenport. Então, se você precisa ou quer saber mais sobre esse conteúdo, eu vou deixar na descrição desse vídeo a recomendação de alguns livros que tem esse conteúdo um pouco mais detalhado, beleza?

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E como sempre, qualquer dúvida pode deixar aí nos comentários que a gente tenta responder.

A gente se vê num próximo vídeo. Abraço!

Sobre a autora

Mirian Ayumi Kurauti é apaixonada pela fisiologia humana, com uma trajetória acadêmica admirável. Ela se formou em Biomedicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), fez mestrado e doutorado em Biologia Funcional e Molecular com ênfase em Fisiologia na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e ainda atuou como pesquisadora de pós-doutorado na mesma instituição. Além disso, já lecionou fisiologia humana na Universidade Estadual de Maringá (UEM) e biologia celular na UEL. A sua última experiência como professora de fisiologia humana foi na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Fundadora da MK Educação Digital Ltda (MK Fisiologia), atualmente, Mirian é a mente criativa por trás de todos os conteúdos publicados nas redes sociais da empresa.

Apaixonada pela docência, Mirian adora dar aulas de fisiologia humana, mas de um jeito mais descontraído e se diverte muito ensinando. Ela está sempre buscando aprender algo novo não só sobre fisiologia, mas sobre qualquer coisa sobre a vida, o universo e tudo mais. Por isso, é uma consumidora compulsiva de conteúdos de divulgadores científicos. Nas horas vagas, você pode encontrá-la na piscina, treinando e participando de competições de natação. Para Mirian, a vida só tem graça, se ela tiver desafios a serem superados. Hoje, o seu maior desafio é ajudar o maior número de estudantes a entender de verdade a fisiologia humana, principalmente através de suas videoaulas publicadas no canal do YouTube MK Fisiologia.

Foto da autora do post Mirian Ayumi Kurauti criadora do MK Fisiologia
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