[#1] PÂNCREAS ENDÓCRINO: INSULINA (SÍNTESE E SECREÇÃO DE INSULINA)

Este post é a transcrição da videoaula publicada em nosso canal do YouTube "[#1] PÂNCREAS ENDÓCRINO: INSULINA | SÍNTESE E SECREÇÃO DE INSULINA".

TRANSCRIÇÕESSISTEMA ENDÓCRINO

Mirian Kurauti

1/1/202510 min read

E aí pessoal, tudo bem com vocês?

Eu sou Mirian Kurauti aqui do canal MK Fisiologia e nesse vídeo a gente vai começar a falar sobre uma glândula muito famosa, o pâncreas.

Relembrando, o pâncreas tá localizado abaixo do estômago, associado ao duodeno por meio do ducto pancreático que juntamente com o ducto colédoco, que vem lá da vesícula biliar, desemboca no duodeno.

O pâncreas é uma glândula mista pois possui duas porções. O pâncreas exócrino, que representam cerca de 98-99% do pâncreas, e é formado por ductos e ácinos que secretam bicarbonato e produzem enzimas digestivas formando o suco pancreático, o qual é lançado no duodeno. Já o pâncreas endócrino, que representa apenas 1-2% do pâncreas, é formado por pequenos grupos de células dispersas entre os ductos e ácinos do pâncreas exócrino, as chamadas ilhotas de Langerhans, as quais contém diversos tipos de células endócrinas que produzem vários hormônios diferentes.

O pâncreas exócrino a gente vê com mais detalhes no sistema digestório. Aqui no sistema endócrino a gente vai focar, claro, no pâncreas endócrino.

As ilhotas de Langerhans ou ilhotas pancreáticas, são pequenos aglomerado de células endócrinas. Estudos estimam que no pâncreas humano possa existir cerca de 1 -2 milhões de ilhotas pancreáticas. Nessas ilhotas a gente encontra, principalmente, quatro tipos de células endócrinas diferentes. Dentre essas células, as mais abundantes são as células beta ou células B, as quais sintetizam e secretam o hormônio insulina. Logo em seguida a gente tem as células alfa ou células A, que sintetizam e secretam o hormônio glucagon; as células delta ou células D, que sintetizam e secretam o hormônio somatostatina; e as células F ou células PP, não porque elas são pequenas, mas porque elas sintetizam e secretam o hormônio polipeptídeo pancreático.

As ilhotas pancreáticas são bastante irrigadas e o interessante é que essa irrigação sanguínea é centrífuga, o sangue arterial chega no centro primeiro e vai em direção a periferia. No centro há bastante células beta enquanto as demais células parecem se situar mais na periferia. Essa organização foi bastante estudada em roedores, mas em humanos é um pouco diferente, e as células beta e alfa estão distribuídas mais aleatoriamente nas ilhotas.

De todas essas células, as células PP são as menos estudadas e a função do hormônio polipeptídeo pancreático ainda não está muito clara nos livros de fisiologia. O mesmo vale pra somatostatina sintetizada e secretada pelas células delta. Embora recentemente essas células vêm sendo bastante estudadas, vocês ainda não encontraram muitas informações sobre a função do hormônio somatostatina nos livros de fisiologia. Por isso, nesse e nos próximos vídeos a gente vai falar mais sobre as células mais estudas, as células beta e alfa, e os seus respectivos hormônios, insulina e glucagon.

Como as células beta são as mais abundantes, a gente vai começar a nossa discussão sobre o pâncreas endócrino, falando sobre o principal hormônio sintetizado e secretado por essas células, a insulina.

A insulina é um hormônio proteico ou peptídico, formado por 51 aminoácidos que se encontram dispostos em duas cadeias peptídicas ligadas por pontes dissulfeto, sendo uma cadeia com 21 aminoácidos (a cadeia A), e outra cadeia com 30 aminoácidos (a cadeia B).

Como todo hormônio proteico, a insulina é sintetizada como qualquer outra proteína, ou seja, lá no núcleo o gene da insulina deve ser transcrito em RNA mensageiro que deve ser traduzido lá no retículo endoplasmático rugoso em uma sequência de aminoácidos formando um pré-pró-hormônio, a pré-pró-insulina.

Ainda no retículo, esse pré-pró-hormônio é clivado e forma um pró-hormônio, a pró-insulina, que ao passar pelo complexo de golgi sofre clivagens e modificações que levam a formação do hormônio ativo, a insulina com suas duas cadeias de aminoácidos, e mais um hormônio derivado da clivagem da pró-insulina, o peptídeo conector ou peptídeo C.

Tanto a insulina quanto o peptídeo C são empacotados e estocados em vesículas secretoras, ou melhor, em grânulos secretórios, os quais sofrem exocitose, ou seja, se fundem com a membrana celular quando a célula é estimulada.

Ainda não se sabe exatamente a função do peptídeo C no organismo humano, por isso vamos focar no principal hormônio das células beta, a insulina.

Como vimos, pra que a exocitose dos grânulos secretórios aconteça, é necessário um estímulo nas células beta, e o principal estímulo pra secreção de insulina é o aumento da concentração de glicose no sangue, ou seja, é o aumento da glicemia. Mas como exatamente esse aumento da glicemia estimula a secreção de insulina nas células beta?

Pra responder essa pergunta, pensem comigo, em que situação a glicemia pode aumentar?

Quando a gente ingere alimentos ricos em carboidratos, certo? Então quando isso acontece, a glicose desses alimentos é absorvida no trato gastrointestinal e entra na circulação sanguínea, aumentando a glicemia.

Essa alta concentração de glicose no sangue vai chegar lá nas células beta que apresentam, em sua membrana celular, um transportador de glicose específico. Estudos em roedores mostram que esse transportador é o GLUT2, enquanto estudos em humanos mostram que esse transportador é o GLUT1. Mas independente do tipo de transportador, todos eles realizam difusão facilitada da glicose, um tipo de transporte que depende do gradiente de concentração do soluto.

Então, se tem mais glicose fora da célula, a glicose é transportada a favor do seu gradiente de concentração pra dentro das células beta.

Ao entrar, a glicose é fosforilada pela enzima glicoquinase formando glicose-6-fosfato, que pode ser metabolizada gerando ao final da glicólise, ciclo de Krebs, e fosforilação oxidativa, muitas moléculas de ATP, aumentando assim a razão ATP/ADP. E sabe o que acontece quando essa razão aumenta, ou seja, quando tem muitas moléculas de ATP?

Prestem atenção, quando tem muito ATP, o ATP se liga em canais iônicos seletivos ao íon potássio e bloqueia esses canais. Por isso esses canais são chamados de canais de potássio sensíveis ao ATP.

E agora, lembre-se que se esses canais estiverem abertos o potássio tem força eletroquímica pra sair da célula, certo? Então se esses canais forem bloqueados pelo ATP, o potássio fica preso dentro da célula, e esse acúmulo de cargas positivas, vai despolarizar a membrana celular. Ocorre então uma alteração na voltagem dessa membrana, e o seu potencial fica mais positivo, ou seja, ocorre uma despolarização. Quando isso acontece canais de cálcio dependentes de voltagem, se abrem, provocando a entrada desse íon na célula.

Lembra do mecanismo de liberação dos neurotransmissores? Quando o cálcio entrava no terminal axonal, as vesículas contendo o neurotransmissor sofriam exocitose, ou seja, se fundiam com a membrana celular, causando a liberação dos neurotransmissores na fenda sináptica.

Aqui também acontece isso, quando o cálcio entra na célula, ele ativa a exocitose dos grânulos contendo insulina, causando a secreção desse hormônio, que pode se difundir em direção ao capilar sanguíneo mais próximo e entrar na circulação.

Agora que a gente viu como a glicose estimula a secreção de insulina nas células beta das ilhotas pancreáticas, a gente precisa lembrar que isso acontece quando a glicemia aumentada. Isso significa que de alguma forma a célula beta sabe quando a concentração da glicose tá elevada.

-Mas como a célula beta sabe disso?

A resposta está numa enzima que fosforila a glicose assim que ela entra na célula, a glicoquinase. Essa enzima tem baixa afinidade pela glicose, ou seja, precisa de muita glicose pra ela poder "fosforilar" bastante glicose.

Então quando tem pouca glicose ela fosforila muito pouco, e só um pouco de glicose-6-fosfato é metabolizada, gerando pouco ATP. Mas quando tem muita glicose ela fosforila muito mais, e muita glicose-6-fosfato pode ser metabolizada, gerando bastante ATP. Dessa forma a glicoquinase funciona com um sensor de glicose nas células beta.

Embora a glicose seja o principal iniciador da secreção de insulina, outros fatores metabólicos também podem iniciar a secreção desse hormônio. Por exemplo, durante uma refeição, normalmente a gente não ingere só carboidratos, a gente ingere também proteínas e lipídeos, que são digeridos e absorvidos, aumentando a concentração de aminoácidos e ácidos graxos livres na circulação sanguínea.

Alguns aminoácidos entram nas células beta por transportadores de membrana específicos e podem tanto ativar como entrar nas vias metabólicas pra gerar ATP. Já os ácidos graxos, que entram nas células beta também podem ser metabolizados pra gerar ATP. O aumento da síntese de ATP, como vimos, leva ao fechamento dos canais de potássio sensíveis ao ATP e aí a história se repete, e a insulina é secretada.

Então lembre-se que além da glicose, alguns aminoácidos e os ácidos graxos livres também podem iniciar a secreção de insulina. Mas além desses iniciadores, a gente também tem reguladores da secreção de insulina.

-Como assim?

Os iniciadores geralmente são fatores metabólicos como glicose, aminoácidos e ácidos graxos livres que são metabolizados gerando ATP. Já os reguladores são geralmente fatores hormonais e neurais que podem potencializar ou inibir a secreção de insulina iniciada pelos fatores metabólicos.

Então dentro dos reguladores a gente pode falar primeiro dos fatores hormonais e depois dos fatores neurais que regulam a secreção de insulina.

Bom, durante uma refeição, quando o alimento chega no estômago e no intestino, células endócrinas, presentes nessas estruturas do trato gastrointestinal, secretam alguns hormônios que a gente chama de incretinas, como por exemplo o GIP e o GLP-1. Essas incretinas, como o próprio nome sugere, incrementam, ou potencializam a secreção de insulina iniciada principalmente pela glicose.

Nas células beta, essas incretinas se ligam a receptores acoplados a proteínas G, e ao ativar esses receptores, segundos mensageiros são sintetizados e ativam proteínas efetoras na célula beta, que potencializam a exocitose dos grânulos contendo insulina, estimulado pelo aumento da concentração de cálcio, causado principalmente pelo aumento da concentração de glicose.

Outros fatores hormonais que regulam a secreção de insulina, são hormônios secretados pelas células vizinhas às células beta, como o glucagon secretado pelas células alfa, e a somatostatina secretada pelas células delta lá nas próprias ilhotas pancreáticas.

Dessa forma, tanto o glucagon, como a somatostatina tem ação parácrina sobre as células beta. Enquanto o glucagon, que também ativa receptores acoplados ao mesmo tipo de proteína G, age de forma semelhante as incretinas, potencializando a secreção de insulina, a somatostatina, que ativa receptores a acoplados a outro tipo de proteína G, inibe a secreção de insulina. Esse efeito é interessante pra frear um pouco a secreção de insulina pra evitar que mais insulina do que o necessário, seja secretado.

Além dos fatores hormonais, fatores neurais, no caso neurotransmissores do sistema nervoso autônomo parassimpático e simpático, também participam da regulação da secreção de insulina.

Neurônios pós-ganglionares parassimpáticos liberam acetilcolina, que agem via receptores específicos estimulando a secreção de insulina nas células beta. Já os neurônios pós-ganglionares simpáticos, liberam noradrenalina que pode se ligar em dois tipos diferentes de receptores adrenérgicos presentes nas células beta, um que pode estimular e outro que pode inibir a secreção de insulina. Porém, na célula beta tem mais receptores que inibem do que receptores que estimulam, e o efeito da noradrenalina que predomina, é a inibição da secreção de insulina.

Pra lembrar dessa regulação do parassimpático e simpático sobre a secreção de insulina, é só lembrar das respostas “repouso e digestão” do parassimpático, e “luta ou fuga” do simpático. Durante a digestão, a secreção de insulina é estimulada pelo parassimpático. Mas durante uma situação de luta ou fuga, a secreção de insulina pode ser inibida pelo simpático.

Bom, resumindo tudo até aqui, lembre-se que:

  • O pâncreas endócrino é formado pelas ilhotas pancreáticas que são formadas principalmente pelas células beta que secretam insulina, alfa que secretam glucagon, delta que secretam somatostatina e PP que secretam polipeptídio pancreático.

  • As células beta secretam insulina principalmente quando a glicemia aumenta.

  • Além da glicose, outros fatores metabólicos podem iniciar a secreção de insulina, como alguns aminoácidos e os ácidos graxos livres.

  • Fatores hormonais como as incretinas, o glucagon e a somatostatina podem regular a secreção de insulina pelas células beta.

  • Enquanto o sistema nervoso autônomo parassimpático estimula a secreção de insulina pelas células beta, o simpático inibe.

No próximo vídeo, a gente fala sobre o mecanismo de ação da insulina, não perca!

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Sobre a autora

Mirian Ayumi Kurauti é apaixonada pela fisiologia humana, com uma trajetória acadêmica admirável. Ela se formou em Biomedicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), fez mestrado e doutorado em Biologia Funcional e Molecular com ênfase em Fisiologia na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e ainda atuou como pesquisadora de pós-doutorado na mesma instituição. Além disso, já lecionou fisiologia humana na Universidade Estadual de Maringá (UEM) e biologia celular na UEL. A sua última experiência como professora de fisiologia humana foi na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Fundadora da MK Educação Digital Ltda (MK Fisiologia), atualmente, Mirian é a mente criativa por trás de todos os conteúdos publicados nas redes sociais da empresa.

Apaixonada pela docência, Mirian adora dar aulas de fisiologia humana, mas de um jeito mais descontraído e se diverte muito ensinando. Ela está sempre buscando aprender algo novo não só sobre fisiologia, mas sobre qualquer coisa sobre a vida, o universo e tudo mais. Por isso, é uma consumidora compulsiva de conteúdos de divulgadores científicos. Nas horas vagas, você pode encontrá-la na piscina, treinando e participando de competições de natação. Para Mirian, a vida só tem graça, se ela tiver desafios a serem superados. Hoje, o seu maior desafio é ajudar o maior número de estudantes a entender de verdade a fisiologia humana, principalmente através de suas videoaulas publicadas no canal do YouTube MK Fisiologia.

Foto da autora do post Mirian Ayumi Kurauti criadora do MK Fisiologia
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